3 de abril de 2013

Inveja na Casa dos Bicos | Envy in Casa dos Bicos

É impossível entrar na Casa dos Bicos e não ficar imediatamente rendido(a) ao talento de Saramago. Mesmo os mais indolentes leitores, os que chegam mesmo a ignorar a identidade de Blimunda, Baltasar, Sara da Conceição ou a Rapariga dos Óculos Escuros, não serão alheios à mestria do nosso único Nobel da Literatura. É impossível não enfatizar aqui o “nosso”, com todo o orgulho que me dá saber que os seus originais são portugueses. As escadas íngremes e iluminadas são pedaços de literatura, com frases recortadas do autor. A biblioteca é invejável. A audioteca é viciante. Até a loja de lembranças é entusiástica. Mas o que mais me surpreendeu, maravilhou, extasiou, deslumbrou, fascinou, assombrou, seduziu, cativou, aliciou, atraiu (ufa!) foram as paredes quase forradas das suas obras traduzidas num sem número de línguas. Impossível ignorar que só um escritor do mais alto astuto consegue este feito: encontrar leitores no outro lado do mundo, com uma cultura completamente díspar da sua, com experiências e quotidianos tão distintos, e que ainda assim, algures durante o dia, ao cair da noite ou até de madrugada, encontram tempo para mergulharem nas suas obras. Impossível não desejar um dia chegar assim: longe.


It is impossible to enter in Casa dos Bicos and not be immediately surrendered by the talent of Saramago. Even the most indolent readers, those who even ignore the identity of Blimunda, Baltasar, Sara da Conceição or The Girl with Dark Glasses, are not unrelated to the mastery of our only Nobel Prize in Literature. It is impossible not to emphasize here “our”, with all the pride I can get knowing that his originals are in Portuguese. The stairs are steep and lit with pieces of literature with cut sentences from the author. The library is enviable. The audio library is addictive. Even the souvenirs shop is enthusiastic. But what surprised, amazed, entranced, dazzled, fascinated, stunned, seduced, captivated, solicited, lured me the most were the wallpapered spaces, filled with countless books, translated in tons of languages. It is impossible to ignore that only a writer of the highest astute accomplishes this: finding readers across the world, with a completely different culture, very distinct everyday experiences, who yet, somewhere during the day, the nightfall or dawn, finds time to immerse themselves in his work. It is impossible not wish someday going as far away as he went.

39 comentários:

  1. Estando eu a ler, porque sim, toda a colecção, ou pelo menos grande parte dela, dele é uma grande falha ainda não ter ido à casa Saramago, talvez, inconscientemente, tivesse sido uma boa idéia, assim, fervilhando, visitarei quando terminar esta viagem épica.
    A seguir será Pessoa.
    Andava eu a ler o Sr R. Dos Santos Dan Brown entre outros. É como comprar a obra prima do mestre com a prima do mestre de obras,

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Grande comparação, Diogo. Um dia destes vou roubá-la só porque sim. :-P
      Vás quando fores, tenho a certeza que não te vais desiludir como eu me desiludi com a Casa Fernando Pessoa. É a diferença entre uma ser levada avante por aficionados do escritor, e a outra ser gerida por dinheiros públicos (agora caía aqui bem a dita comparação).

      Eliminar
    2. Por essas e por outras é que saímos do buraco. Dois génios vistos de forma diferente.

      Eliminar
    3. Penso que tem mais a ver com a forma como são tratados, do que com o modo como são vistos. Porque penso que não haverá ninguém capaz de lhes roubar pelo menos o mérito e o adjectivo: geniais.

      Eliminar
  2. Confesso que Saramago não puxa por mim, nunca tive a menor curiosidade em ler o que quer que seja do senhor. Mas já a casa dos bicos... à muito que quero ir lá mas nunca calhou, quem sabe este fim de semana... ;)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sabes como dizia Pessoa? Primeiro estranha-se, depois entranha-se. :-D Independentemente de se gostar muito, pouco ou nada, o talento dele é inquestionável.

      Eliminar
  3. Sou muito sincero, adoro ler! mas adoro mesmo! e nunca li nada de Saramago. Don't ask me why, não sei. Tivesse eu mais tempo para ler, ou me saísse os milhoes, e a minha vida seria viajar de pais em pais e ler nos 4 cantos do mundo!

    Agora estou a ler 1984 (George Orwell), depois vai ser Admirável Mundo Novo (Aldous Huxley), e seguidamente O Bom Soldado Švejk (Jaroslav Hašek). Mas lá está, o tempo é pouco para trabalhar, estudar, cinema, escrever e ler. Às vezes sonho com dias de 50horas só apra poder fazer tudo o que quero! :D

    Mas o teu fds, deu imensas sugestões para eu deambular por aí.. :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Eu sou tipo piolho eléctrico. Não sei quem teve a ideia de dizer que as férias ou os fins-de-semana prolongados são para descansar: eu cá aproveito para fazer de uma assentada um milhão de coisas. Sou gaja para não me deixar ficar pela cama! :-)
      Quanto aos livros: nós vamos mudando, e mesmo que nunca tenhas sentido o apelo por Saramago, não quer dizer que não o venhas a sentir. De hoje para amanhã poderá dar-te na real gana. Se não fosse assim, manter-nos-íamos a vida toda na mesma linha de literatura e isso não tinha graça nenhuma. (BTW, não sou de fazer listas de livros que vou ler de seguida: olho para a prateleira, e escolho. Como se estivesse na biblioteca.)

      Eliminar
    2. Eu não sou de apelos... Muitas vezes nem conheço o autor.. ando por aí, a cirandar nas livrarias, a sentir o cheiro do papel, a ler umas sinopses nas contra-capas, e quando algo me agrada, cesto! :)

      Eu tenho que me regrar, para ter a leitura em dia.. como disse, o tempo disponivel é muito pouco, e nos find de semana ainda se metem uma provas de corrida e ainda fico com menos tempo.. daí as listas :p aaah e porque um é emprestado e não gosto de ficar muito tmepo com coisas que não são minhas.. :)

      Mas irei ler Saramago muito em breve, e por causa de ti! ;)

      Eliminar
    3. Mustache, tens ideia de por onde começar? Não tarda nada, iniciamos um clube de leitura, querem ver? :D

      Eliminar
    4. Ensaio sobre a cegueira para começar, prosseguindo com Envangelho segundo J.C. A evitar: "homem duplicado, intermitências da morte e outras coisas mais "de fim de carreira". Supra sumo para mim: Levantado do chão. Existem outros muito bons, mas a minhas escolhaa e não escolhas são estas. Sempre subjectivo. Esses 3 que recomendei são os que li mais do que uma veze voltarei a ler ainda. Já agora: Memorial do convento é muito bom , mas não aconselhava para começar.

      Eliminar
    5. Mas porque é que nunca ninguém fala da "História do Cerco de Lisboa"? Snif
      (é difícil escolher, isso é verdade)

      Eliminar
    6. Ice Truck Killer, eu sou uma menina à tua beira. Grande leitor te revelaste... :-)

      Engraçado ainda não ter visto ninguém sugerir o "Clarabóia", o seu primeiro romance, e escrito sob pseudónimo. É muito fácil de ler, mas já delator das suas principais tendências e referências. Eu gostei muito desse, e considero-o um bom ponto de partida para quem quer começar a jornada saramaguiana.

      Eliminar
    7. Esse clarabóia não foi um que só foi editado após a morte dele? e que ele tinha pedido que assim fosse?
      tenho uma amiga que o primeiro livre que leu dele, odiou o gajo, mas depois voltou a ler outr e começou a gostar mais e mais.. :)
      já vi que tenho mesmo que ler qualquer coisa do sinhori..

      Eliminar
    8. É esse mesmo, Mustache. Mas se começares por ler esse, será difícil entrosares-te com os outros de seguida. E também concordo com o que alguém disse por aqui: Memorial do Convento é bom, mas difícil para começar.

      Eliminar
    9. Wallis, tu e meio mundo. Também te foi de leitura obrigatória no liceu?

      Eliminar
    10. Não, escolheram a "Aparição". A maioria não quis Saramago.

      Eliminar
    11. Blaghhh... Desse é que não gostei nada. Gostaste de Vergílio Ferreira? Eu li-o uma só vez há 10 anos e fiquei assustada. Não voltei.

      Eliminar
    12. Eu também não gostei nada. Nem desse, nem dos outros dele (espreitei, mas de facto só confirmou que era um estilo que não gostava). Mas há muita gente que gosta, muitos colegas meus adoraram :s
      A outra alternativa era "Mau tempo no canal" e olha que -para mim- não é melhor.

      Eliminar
    13. Eu obriguei-me a ler a Aparição até ao fim, e até anotei no meu caderninho uma série de ideias e frases boas, daquelas inspiradoras. Pelo menos isso. Mas acima de tudo achei-o muito denso psicologicamente, deprimente até, e por isso difícil de entender... Se calhar teve a ver com a altura da vida em que estava. Isso também importa, não?

      Eliminar
    14. Sim, pode ser isso. Eu detestei e ficou marcado com uma cruz.

      Eliminar
  4. Eu fui à Casa dos Bicos logo na abertura (cortesias laborais LOL) e é uma espaço fantástico. Em conversa com a Pilar del Río conheci algumas curiosidades do local e ainda fiquei mais fascinada.

    ]Nota: não consegues tu, nem ninguém, comentar o post da canção dos Stereophonics, porque o post não permite comentários, mas podes - se quiseres - comentar por e-mail, está no meu perfil]

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Estou a ver que te relacionas muito bem, Gata. :-) "Em conversa com Pilar del Río"... Que finess! ;-)

      Eliminar
    2. "Travail oblige", my dear... Eu sou como o Romeiro de "Frei Luís de Sousa": ninguém! :-)

      Eliminar
    3. Quem vem abaixo de ninguém, Gata? :-P (É lá que estou.)

      Eliminar
  5. Obrigada pelo post pois sou uma admiradora do talento literário de Saramago.Ainda não tive oportunidade de visitar a Casa dos Bicos....mas quando for a Lisboa terei de lá ir.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Aproveita assim que possas, Laura, são €3,00 bem gastos. Eles têm horários bastante alargados.

      Eliminar
  6. Eu já lá estive, mas levei com a porta no nariz porque nesse dia fechavam mais cedo, vai daí, fiquei amuada. Mas vou voltar e não me parece que vá ficar desiludida. Eu tenho sempre pudor em falar do Saramago, porque acho sempre que o que possa dizer nunca lhe fará jus. Ainda tenho muita coisa para ler nesta vida, mas o Saramago é o meu preferido, como é bom de ver. As passagens mais bonitas que já li pertencem-lhe e ficarão comigo para sempre.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não te sabia fã dele, Wallis. :-) Ainda bem, acertei na muche. Não te desiludas com os horários, pois agora estão mais alargados. Pelo menos foi o que li, que têm tido em preocupação estarem abertos aos fins-de-semana, feriados...

      Eliminar
    2. R., sou fã mas assim mesmo muito. Aliás, o excerto que consta lá na minha baiuca, no cimo, é dele (só não está lá a referência porque não coube e não sei como fazer caber :s). Eu não digo que ninguém liga à "História do Cerco de Lisboa"? Humpf (achei o livro lindo, não sei se já deu para ver)
      Pois eu já fui tocada pelo Mestre, sim, sim, ele precisava que eu me desviasse para poder passar e tocou-me no ombro, não é o máximo?? :DDDD

      Eliminar
    3. E tomaste banho depois disso? :-D
      Nunca li a "História do Cerco de Lisboa", por isso ñ podia reconhecer o excerto. Eu sou fraquinha na matéria de Saramago. Só li quatro títulos: Memorial do Convento, Ensaio sobre a Cegueira, O Ano da Morte de Ricardo Reis e mais recentemente, Clarabóia. A questão é que acompanhei sempre com carinho a sua mestria, mas ainda tenho um longo caminho a percorrer para conhecer melhor a sua obra. Eu sou uma gaja de estrangeiros. 8-)

      Eliminar
  7. Eu gosto bastante das obras de Saeamago e não conhecia esse lugar, sou um bocadinho ignorante pelos vistos. Pela tua descrição deve ser um lugar fabuloso!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não és ignorante nada, Audrey. Até porque a Fundação Saramago só está na Casa dos Bicos desde Junho de 2012, portanto há menos de um ano. Já a casa, uma referência histórica, já lá está há uns seculozinhos mais. :-P

      Eliminar
  8. Muitos escritores mundialmente famosos (já idos) não têm o privilégio de ter o espaço que ele tem, ou melhor que os seus admiradores têm para usufruír. Para mim, os livros finais desiludem quem leu a sua obra até 2000, por isso, para quem quiser conhecer a obra sou da opinião que, deve começar pelos livros que escreveu no auge da sua criatividade.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Queres ser meu amigo, Ice Truck Killer? Gosto de pessoas conhecedoras de livros. :-)
      Eu não li nada dos últimos anos, mas se lhe tivéssemos perguntado, ele talvez dissesse que eram resultado da óbvia evolução da escrita. As pessoas vão mudando, e os escritores são reflexo disso como ninguém.

      Eliminar
    2. Conhecedor! Eu? Ahahah..Seu teu amigo, claro que sim. Admito que seja a tal evolução como dizes, mas se tivermos em atenção a suas intervençõe e entrevistas até dado momento da história e o depois, notamos uma grande diferença na atitude do homem. A sua irreverrência e o seu pro-activismo não mais foram os mesmos. Isto tb se relectiu na sua obra. Obvimante que a idade pode ter pesado, ou, simplesmente o estilo como que se alterou como dizes. Só ele sabe, mas os livros de setentas, oitentas e noventas deixam saudades. Os deste século, já nem por isso. Nada lhe retira o mérito. Um enorme escritor.

      Eliminar