Foi em 2008, aquando da visita ao Centro George Pompidou, que me deparei pela primeira vez com a afronta. Ali, entre as obras e as instalações de uma das maiores colecções de arte do mundo, ela exibia-se com orgulho. Pior ainda: não era apenas uma, singular; eram 3, no plural. Sim, 3. Iguais. Exactamente iguais, mas de artistas diferentes. Como se fosse possível, do ponto de vista da concepção artística, 3 “pintores”, em momentos, países e culturas distintas, terem a mesma ideia e pintarem telas semelhantes. Passei alguns minutos da minha vida a rir a bandeiras despregadas com aquilo que via. Numa fracção do tempo pensei que fosse uma brincadeira. Logo a seguir cheguei até a indagar que talvez fosse eu, inculta na matéria, incapaz de interpretar aquelas que orgulhosamente se exibiam para mim, como se dissessem: somos simples, mas tu não nos entendes. Felizmente caí logo em mim, e percebi realmente do que se tratava: 3 pintores, dos tais momentos, países e culturas distintas, aproveitaram um claro momento de desinspiração e pintaram 3 telas de branco. Pior do que o vitupério ostentado, foi ler na sinalética de uma das telas, aquilo que a “artista” (não me lembro do nome; apenas recordo o género) escrevia acerca da técnica do pincel. Surreal! Como se numa tela branca pudéssemos apreciar e reconhecer a dita.
Recordei-me deste momento no último fim-de-semana, aquando da visita à Colecção Berardo no CCB: naquela que é a maior colecção de arte exposta em Portugal, na segunda parede de entrada do museu, lá estava ela novamente: a tela branca. Provavelmente pintada por um quarto “artista” não-relacionado com os 3 que expunham no Pompidou. Mais um claramente desinspirado, que decidiu contornar o seu desacerto com ignomínia. Junto à tela havia uma inscrição dando nota de que o conteúdo daquela “obra” devia ser mantido em segredo; que a dinâmica da mesma devia ficar apenas sob o conhecimento de quem a havia concebido. Engraçadinho, não? Não vale a pena oferecerem-me grandes explicações filosóficas sobre uma tela branca, que ela está no seu estado mais puro, o da pré-pintura. Também não a justifiquem como uma pintura em potência; porque se assim fosse, ela estava na Papelaria Fernandes à espera de ser comprada por um verdadeiro artista, ao invés de estar a ser exibida como obra final de um pintor de arrojo. Como alguém dizia no outro dia, é como comparar a obra-prima do mestre, com a prima do mestre-de-obras¹.
[¹ Desculpa a usurpação, Diogo. Mas eu tinha avisado que ia roubar, não tinha?]
It was in 2008, when visiting Centre George Pompidou, when I faced the outrage the first time. There, between works and installations of one of the largest art collections in the world, it was exhibiting itself with pride. Worse than that: it wasn’t just one, singular; they were 3, plural. Yes, 3. Totally equal. Exactly the same, but from different artists. As if it was possible, from the point of view of artistic design, 3 "painters", at distinct times, countries and cultures, have the same idea and paint similar canvas. I spent a few minutes of my life laughing out loud with what I was seeing. I thought it was a joke during a fraction of time. Then I actually wondered that maybe I, uneducated in the matter, was unable to interpret those who proudly were exhibiting to me, as if they were saying: we are simple, but cannot understand us. Luckily my mind got clear then, and I realized what it really was: 3 painters took a clear advantage from a non-inspirational moment and painted everything in white. Worse than the flaunted insult, was the signage of one of the canvas: the artist was explaining the brush technique. Surreal! As if in a white canvas we could appreciate and recognize it.
I remembered this moment in this last weekend, when visiting Berardo’s Collection in CCB: in the biggest collection of art in Portugal, on the second Wall at the entrance of the museum, there it was again: the white canvas. Probably painted by a fourth “artist”, non-related to the other 3 that were in exhibition in Pompidou. Another one with a lack of inspiration, who decided to skirt around his mistake with ignominy. Near the canvas there was an inscription telling that the content of the piece should be kept in secret; that the dynamics of it should only be under the knowledge of whom had conceived it. Funny guy, isn’t he? It is not worth offering me great philosophical explanations about a white canvas; that it is in its pure state, the pre-painting state. Please don’t try also to justify it with potential. If it was so, it should be in some stationery waiting to be bought by a real artist, instead of being displayed as the final work of a painter with audacity.
oh R, mas isso é aaaaaaaaaaaaaaaaarte
ResponderEliminar(teres direito a uma explicaçãozita junto à obra já é uma sorte, mas isto é um à parte)
Acho que o "artista" teve necessidade de se justificar.
EliminarBem desconhecia completamente e realmente não tem nexo...enfim..expliquem lá vá.
ResponderEliminarAs explicações que dão são as que fui apontando... a tal pré-pintura, por exemplo.
EliminarGosto bastante das tuas opiniões, tens alguma profissão ligada à arte?
ResponderEliminarConcordo com o teu comentário, quantos mais meios as pessoas têm, mais se armam e de facto é mesmo verdade!
Audrey, tenho uma profissão altamente estupidificante, mas nos tempos livres tento aculturar-me um pouquinho. E acima de tudo, sempre tive muitas opiniões. Uns diriam que são até demais. :-P
EliminarPOis eu admito que acho esse tipo de arte - que nem arte é - meio pateta.
ResponderEliminarMas prolifera. Cada vez mais.
EliminarBom, acho que o filme português "Branca de Neve" de João César Monteiro consegue superar essas telas. Quem não o conhecer pode investigar rapidamente no google.
ResponderEliminarQuanto ás telas em branco -ou pintadas de branco, é simples: aquilo é para nós, o visitante fazer um desenho pelo próprio punho, bater punho no fundo como diz lá o outro azeitolas que se meteu com o relvas.
Portanto, da próxima vez, leva lápis de cor ou guaches , faz o favor de valorizar a obra do Berardo, ok? Nem que seja com uma pintura do estilo "Miró".
Ao menos o filme ainda tinha palavras para sustentar alguma forma de arte... Aqui a tela, é só tela. No seu estado cru, tal qual está à venda numa papelaria. Da próxima vez vou realmente levar uns lapizinhos para deixar lá o meu cunho. Miró? Sou capaz de melhor do que desenhar o "Cabelo a ser perseguido por dois planetas".
Eliminarquantas vezes não olhaste já para uma nuvem, ou para uma parede em branco e quanto mais olhas, mais parece que ali consegues ver qualquer coisa?! e o teu cerebro vai criando ali mil e uma coisas e tão depressa vês um cão com 7 pernas como a seguir uma flor entrelaçada numa árvore?! estes quadros destes artistas, mais não são do que, janelas para a tua imaginação!
ResponderEliminaré como Pollock, que era um génio, e a determinada altura da sua vida, mais não fazia do que mandar tinta para cima das telas, de uma forma aleatória! :D
Mas a nuvem ainda me oferece cor e nuances, certo? Uma tela branca não me deixa mais à imaginação, que não o vazio.
EliminarSou inculta no que toca a pintura, verdade seja dita, e sou ainda pior a interpretá-la. Achei curioso serem três pinturas "iguais" mas penso que cada um dos artistas queria passar uma mensagem diferente, talvez. :)
ResponderEliminarAs explicações de duas que vi são diferentes. Mas na minha opinião, são apenas necessidade de justificação.
EliminarEu penso que é audácia, mas sou um zero a esquerda no que diz respeito a arte, penso que conseguem captar a atenção das pessoas e coloca-las perante o quadro a interpretar o que o pintor querá mostrar com aquilo. e a interpretação varia consoante a pessoa que esta perante ele, seja ele um entendido ou não de arte.
ResponderEliminarObrigada pelas palavras no meu cantinho, quando falo em sorrir, não me refero a estar sempre a sorrir para as pessoas, mas sim a sorrir para a vida, e encontrar força para superar as coisas menos boas, e para mim ver algo positivo numa coisa menos boa tem-me ajudado muito.
Quanto as pessoas que nos desiludem, a culpa é nossa porque lhes damos demasiada importância, eu já sofri demasiado, com muita gente, que agora não me deixo atingir, não é fácil mas consegue-se.
Acredita que o optimismo faz milagres, dentro de nós.
Bom fim de semana
Beijinhos
Eu cá não consigo interpretar mais do que a idiotice dos "artistas". :-P
EliminarUma tela em branco não é nada mais que uma idiotice. Engraçado, ocorreu-me imediatamente o "Branca de Neve" de J. C. Monteiro , e que também não tive paciência para ver até ao fim...embora tivesse gostado muito de " Recordações da Casa Amarela"...
ResponderEliminarOs artistas não têm sempre razão.
Já por aqui se tinha falado no "Branca de Neve". Mas para mim esse tem mais conteúdo do que a dita tela. E é isso: nem tudo o que um artista produz é arte.
EliminarVim devolver a visita...gostei e vou ficar por aqui está bem?
ResponderEliminarBjs
Maria
Sê bem-vinda, Maria.
EliminarBom, assim sendo vou aproveitar o cansaço para escrever um comentário tão bom mas TÃO bom que ficará nos anais da estória dos comentários. Aqui vai:
ResponderEliminarTenho dito!
Lolol... Um dia também vou "escrever" um livro em branco, dizer na contracapa que o seu conteúdo é o mais espectacular do mundo e grande candidato a Nobel, mas que a sua dinâmica é infinitamente impossível de reduzir às páginas.
EliminarVou guardar o meu comentário para quando voltar a ter internet em casa, que é já depois de amanhã. Até já.
ResponderEliminarOnde ficou esse comentário? :-P
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